sábado, 23 de setembro de 2023

Quem é aquele?

 

Quem é aquele?

 

Corria o ano de 1934 e nada podia fazer senão entender o que se passava. Chovia copiosamente, as ruas mais pareciam rios das Monções. Nunca se tinha visto tanta água a cair do céu! Porém, um sábio Ansião dizia:

- Já em 22 os rios de encheram e a ribeira da Artosca transbordou.

Nada me confortava. Ter visto os meus poemas a irem rio abaixo, tornou-me insensível a qualquer tipo de dor alheia. Uma vaca que se afoga? Uma velhinha que berra por socorro, com água pelas axilas? Nada, um eterno e estrondoso vazio percorre as minhas veias negras de descrédito no universo!

- Mas que mal fiz eu a quem quer que fosse?

A Deus? Sim, poderia ter sido, mas nem Ele se assoma e tem a coragem de dizer:

- Tu tens uma marreca!

Ou então... a tia da Anica, que me dizia no outro dia:

- Felício, tem cuidado, que estás à beira do poço...

Se cai? Claro! Se me levantei? Um rasgo na face, que ainda hoje me acompanha e, uma farpa de tijolo na nádega direita. Mais de resto, umas costelas rachadas e o ego ferido, por ter dito ao Carlitos que conseguia ler poemas do Zé Pilintra, contornando o dito... poço, claro!

Adiante. No dia seguinte, depois de lavar tudo com aguarrás (ou seria raz?) e esfregar com pedra pomes, dei comigo a pensar:

- Afinal quanto dinheiro gastei ontem naquilo tudo?

Pensamento que tenho quase a certeza se abateu sobre quase todos nós, após uma noite de mil tascas e desvairos.... Seguindo estas notas, congeminei uma audaz canção de saudade:

 

Ó ardor do meu peito

Que feito me traz amor

Na rua do nunca ter visto

Um imprevisto, te tornou nua

 

Nada, nada

Fada, amada

 

Galopa agora errada

Amada morta na tropa

O Verão foi-se e agora?

Morta é a flor do coração!

 

Nada, nada

Fada, mata!

 

Como dizia: corria o ano de 1934 e por ser Outono, tudo fazia mais sentido, pois a vindima tinha começado e a minha Efigénia estava de volta!

Fabuloso! Só não me consigo lembrar quem foi o tipo que me levou a mula para casa…

3 comentários:

  1. Bom!! Vale a pena voltar aqui sempre!!

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    1. É sempre bom ouvi-lo! Ovo? Não... ouvir. Ovo-lo? Não!

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  2. Gostei e fez-me viajar em nostalgia a um passado já algo distante, não pela queda do Felício mas pela queda do autor para a prosa.

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CU menta!