terça-feira, 26 de setembro de 2023

Homines Salsi

 "Juntas um punhado de pessoas, com um punhado de legumes e bates bem, até obter uma massa homogénea."


Dizia uma pessoa na TV. Fiquei perplexo, mesmo circunspecto. A imagem que não me abandona a retina, é a enorme colher de pau que mistura, e junta, num movimento absurdo, constante e ao mesmo tempo desigual, tal não são as diferenças de proporções entre os ingredientes juntos. O enorme esforço em obter uma massa homogénea sem que o sangue dos legumes se torne obsceno e os fluídos dos humanos, se tornem coalhados, grossos pela falta de calor momentâneo, que caracteriza a energia acumulada e gerada por um ser vivo, da classe dos hominídeos, mamíferos.


O enorme wok, de paredes concavas, gastas pelo uso de inadequado de utensílios de cozinha, ofusca o cozinheiro, que se vê obrigado a parar por uns segundos, visto que o cheiro e a luz o ofuscam. De que forma um cheiro ofusca? Simples. Exercício: 10 malaguetas picantes, das que picam a valer, numa frigideira com um fio de óleo muito quente e depois digam que não precisam de óculos de sol para terminar a coisa...


Nesse momento, o wok atinge a temperatura desejada, toda uma concordância de factores universais, fazem questionar a origem das pulgas e o bem-estar dos gatos sem pelos. Adjetivos que não nos fazem ficar indiferentes a toda a conjuntura gastronómica.


Será um prato real? Ou uma analogia? Dará que pensar? Serão os legumes as ideias? Serão os humanos os livros? Serão mesmo humanos, salteados com legumes?


As respostas estão dentro de cada um de nós. Na forma como comemos, na forma como escutamos, ou na forma como sentimos o calor do wok. Quem melhor que nós para saber como usar um wok? São essas as pessoas que sabem de facto quais são as respostas, quais são os legumes que temos de juntar aos humanos e cozinhar, lentamente, até obter um resultado homogéneo, que todos nós concordemos e nos pareça correcto, mesmo que seja absurdo.


Agora que já estão todos muito atentos e enternecidos por estas últimas palavras de conclusão e desfecho bonito, vamos lá então: Na Cannibal Island TV, Anne Dillan, tem um programa que em directo da cozinha do seu restaurante "Homines Salsi", 4 estrelas CAMAC e faz as delícias dos espectadores.


sábado, 23 de setembro de 2023

Quem é aquele?

 

Quem é aquele?

 

Corria o ano de 1934 e nada podia fazer senão entender o que se passava. Chovia copiosamente, as ruas mais pareciam rios das Monções. Nunca se tinha visto tanta água a cair do céu! Porém, um sábio Ansião dizia:

- Já em 22 os rios de encheram e a ribeira da Artosca transbordou.

Nada me confortava. Ter visto os meus poemas a irem rio abaixo, tornou-me insensível a qualquer tipo de dor alheia. Uma vaca que se afoga? Uma velhinha que berra por socorro, com água pelas axilas? Nada, um eterno e estrondoso vazio percorre as minhas veias negras de descrédito no universo!

- Mas que mal fiz eu a quem quer que fosse?

A Deus? Sim, poderia ter sido, mas nem Ele se assoma e tem a coragem de dizer:

- Tu tens uma marreca!

Ou então... a tia da Anica, que me dizia no outro dia:

- Felício, tem cuidado, que estás à beira do poço...

Se cai? Claro! Se me levantei? Um rasgo na face, que ainda hoje me acompanha e, uma farpa de tijolo na nádega direita. Mais de resto, umas costelas rachadas e o ego ferido, por ter dito ao Carlitos que conseguia ler poemas do Zé Pilintra, contornando o dito... poço, claro!

Adiante. No dia seguinte, depois de lavar tudo com aguarrás (ou seria raz?) e esfregar com pedra pomes, dei comigo a pensar:

- Afinal quanto dinheiro gastei ontem naquilo tudo?

Pensamento que tenho quase a certeza se abateu sobre quase todos nós, após uma noite de mil tascas e desvairos.... Seguindo estas notas, congeminei uma audaz canção de saudade:

 

Ó ardor do meu peito

Que feito me traz amor

Na rua do nunca ter visto

Um imprevisto, te tornou nua

 

Nada, nada

Fada, amada

 

Galopa agora errada

Amada morta na tropa

O Verão foi-se e agora?

Morta é a flor do coração!

 

Nada, nada

Fada, mata!

 

Como dizia: corria o ano de 1934 e por ser Outono, tudo fazia mais sentido, pois a vindima tinha começado e a minha Efigénia estava de volta!

Fabuloso! Só não me consigo lembrar quem foi o tipo que me levou a mula para casa…