terça-feira, 28 de novembro de 2006

Planeta dos homens

Hoje acordei de manhã com uma ideia fixa, vou comprar um humano doméstico.
Assim fiz. Primeiro fui comprar comida e uma trela, o pobre coitado tem que se alimentar e não pode andar por aí solto. Fui à loja de humanos mais próxima. Sempre tive uma fixação por raça grande, vamos ver se têm. Mal cheguei lá apaixonei-me pelo maior humano que lá estava. Ainda era pequeno, mas pelo tamanho da tíbia, seria por certo um bom espécime e bem grande, era mesmo isso que eu queria. Só tinha receio que fosse um pouco agressivo, mas o dono da loja tranquilizou-me de imediato. Disse que esta raça é muito afável, óptima para ter num apartamento e são pouco movimentados. Eu já tinha lido umas quantas coisas acerca de raças grandes e o pior é o alojamento e a comida. De qualquer forma estava decidido. Trouxe-o. Tão giro! Tão querido, tão fofo. Escolhi macho, pois as fêmeas são um problema. O período e a operação para laquear trompas, mesmo assim preferia fêmea, mas macho é melhor. Pensei em comprar uma casinha para o transportar mas como crescem tão rápido, é deitar dinheiro fora. Meti-o na bagageira, muito sossegado, lá foi. Com um olhar muito meigo. Tinha 3 anos, mas num instante ficaria com 15 e ainda bem, é a idade que eu gosto mais. Comentei outro dia com um estranho, que precisava de comprar um humano doméstico, ao que ele prontamente disse para eu não me preocupar quando for velho, pois posso o mandar abater e assim não teria que me preocupar com todos os problemas que assolam os humanos domésticos na velhice. Achei aquilo muito mau e quando o humano doméstico chegar há idade de 45 anos vou doa-lo a uma instituição de caridade para trabalhos menores, pois necessitam sempre de alguém para ajudar nalgumas tarefas.
Cheguei a casa e mostrei-lhe logo a varanda onde ia ficar, sentou-se logo no banco e pediu comida. Que giro. Que fofo. Pedi a ele que tivesse paciência mas primeiro ia guardar tudo e tomar banho, só depois podia dar-lhe comida. Choramingou um pouco, mas depois de uma festa na cabeça e uma palmadas no rabo lá sossegou. Fechei a varanda e fui. Arrumei as coisas todas, despi-me e fui para o banho. Tinha que arranjar um nome para o bicho e o banho iria servir como inspiração. Pensei em Banzé, Chinês, Frasco, Óleo, pensei em tantos, mas nenhum me soava bem. Até que um rasgo de inspiração me varreu a cabeça. Atum! Isso mesmo! Atum! Ideal! Ó Atum isto, ó Atum aquilo, Atum anda cá, toma Atum, vai buscar Atum, soava mesmo bem e assim ficou... Atum! Acabei o banho, sequei-me, vesti-me, fui para a cozinha preparar a primeira comidinha dele. Estava tão feliz, tinha satisfeito o meu grande desejo, ter um humano doméstico. Estava tão sossegado, ainda bem, assim é que eu gosto, sabe onde tem que estar e é sossegado. Abri a porta da varanda e qual não é o meu espanto quando vejo o chão todo cheio de fezes. Fiquei pior que estragado, mesmo fulo. Eu todo contente que lhe ia dar comida e vejo aquilo, deu-me cá uns vómitos! Atirei a comida para o chão, dei-lhe duas valentes palmadas onde calhou, disse-lhe para nunca mais fazer aquilo e fechei a porta com toda a força! Estava mesmo muito chateado. Compro um animal destes para ficar bem e fico assim...?! Isto não está a começar bem! Fui para a sala e deixei-o estar, choramingou um pouco, mas depois calou-se. Liguei a televisão, mas não consegui ficar muito tempo, algo me perturbava. Fui outra vez à varanda, o pobre coitado estava a comer a comida do chão e o resto que estava na tigela, olhou para mim com um olhar de terror e saltou para trás, bem para o fundo da varanda. Coitado, estava cheio de medo de mim, não compreendi porquê e aproximei-me. Encolheu-se cada vez mais, cada vez mais pequeno e quando lhe toquei todo ele tremia. Que estranho, o que lhe fizeram para estar assim? Devem tê-lo tratado muito mal, tive tanta pena dele. Mas não podia ceder, ele não podia ficar dentro de casa. Uma ou outra vez sim, mas não logo na primeira. Apanhei tudo do chão, lavei o chão, fui buscar mais comida e pus a tigela no chão. Chamei-o, mas não vinha, passei-lhe a mão pela cabeça e falei com ele com calma, olhou-me nos olhos e disse: Se um dia me quiseres como animal de estimação, terás que me respeitar! - e saltou pela varanda do meu 5º andar, estatelando-se no chão do passeio e morrendo de imediato.

Uma coisa é certa, eu como humano superior não compreendi o que aquele humano doméstico me quis transmitir, mas serviu como emenda. Humanos domésticos em casa? Só com uma rede na varanda!

1 comentário:

  1. A sério...! :) A tipica mentalidade do humano humano que não é mais do que um bicho quando decide adoptar animais para os tratar assim. Muito bom...! Isabel S. :)

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