O frio gelado que percorria a rua, não tinha orientação, nem sentido, soprava certo de sítios que não sabemos ainda como os descrever, ou sequer se têm de ser descritos.
No fundo da rua um cão cruzava a rua, fitando quem passava,
numa atitude desafiadora, mas ao mesmo tempo vagabunda. Há muito que as janelas
das casas térreas se mantinham negras, sem luz e vida. As luzes exteriores dos
candeeiros velhos e corroídos pelo sal do mar, cintilavam ténues e sem vontade
e aquecer seja quem fosse, muito menos dar vislumbre a um pedaço de animal que
jazia na beira do passeio. O cão, de olfacto apurado e magro que nem um cão,
salivava, tal como eu, mas por razões bem diferentes. A minha fome não iria ser
saciada por um pobre pedaço de pombo, a minha fome iria ser saciada na energia
libertada entre a guerra que se iria apoderar de mim, na luta entre o canídeo e
o humano desarmado e, por conseguinte, à partida sem qualquer hipótese de
vencer.
No entanto, a determinação da luta, da vontade de conseguir
ter algum tipo de vitória, mesmo que fosse ténue, apoderou-se a cada segundo de
mim. O cão, farejava em delírio, só com o sentido do pedaço de pombo infecto.
Mas por outro lado, todo o tamanho do humano, transformou-se num pedaço de
bovino suculento. Os olhos maiores que a boca, trespassavam o meu peito, na
busca da sede ser consumida. Nada podia fazer, senão lutar.
Como humano, poderia ter várias soluções, entre elas, o
bluff que poderia ganhar uma luta desigual, ao imitir sons que apavorassem o
pobre cão enfraquecido pelo jejum, ou então, pegar mesmo no animal em peso e
partir-lhe a coluna, mesmo que isso envolvesse ser perfurado por caninos de uma
força que esmaga, mas iria conseguir recuperar e por outro lado, o pobre
coitado não.
Pensei de outra forma. E se lhe desse de comer e ficasse
amigo dele?
Ainda hoje caminha ao meu lado e não há igual.
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